MSB – Movimento dos Sem Banho

shutterstock_10018546Torceu inutilmente a torneira de aço cromado na vã esperança de ver desabar sobre sua cabeça um bocado de água. À parte um pingo isolado – certamente uma solitária gota desgarrada de seu bando – nada mais saiu.

Conquanto não tivesse mesmo muito tempo – as oito em ponto deveria bater ponto – desistiu da empreitada e saiu sem banho mesmo. Não sem antes dar uma reforçada na cota de perfume: nuca, punhos, bochecha e ombros.

Nunca entendeu muito bem porque encerrava o ato de perfumar-se esfregando a mão no ombro. Com pouco mais de um metro e sessenta, era pouco razoável supor que fossem fuçar pelas bandas do seu ombro. Mesmo assim era a parte do corpo que recebia sempre a cota final do líquido impregnado de sândalo e lavanda.

O dia transcorreu com a lentidão natural dos dias normais. E a falta de banho não se fez notar.

Fez os cálculos. Economizou 135 litros de água e sem maiores consequências. Se tomasse banho dia sim, dia não, economizaria mais de dois mil litros num único mês. Se apenas mil pessoas o seguissem seriam dois milhões de litros economizados. Se toda a população aderisse aos novos hábitos seriam bilhões de litros de economia. A fórmula perfeita. Um dia apenas sem banho não causaria problemas tão severos em termos em termos de higiene ou convívio social, mas um grande impacto no consumo geral.

No dia seguinte, relatou sua experiência ao chefe, que entusiasmado, incentivou-o a inscrever sua história no prêmio de Empreendedor Social do Ano.

Logo sua história ganhou as páginas dos jornais e as manchetes dos principais programas de Televisão. Virou símbolo do desprendimento pessoal e da luta por um comportamento ecologicamente correto.

Claro que de início a população torceu o nariz para a iniciativa. Alguma coisa parecia não cheirar bem nessa ideia.

Mas assim como o cigarro enfrentou sua decadência após décadas de glória frequentando bocas de artistas e mesas de intelectuais, esse parecia agora o destino inevitável do banho, essa coisa antiquada que em algum momento posterior à Segunda Guerra Mundial incorporamos como hábito diário.

Insuflado nas redes sociais, o movimento foi logo adotado por militantes ecológicos, intelectuais, artistas e principalmente políticos, sempre afeitos a uma sujeirinha. Estava criado o MSB, Movimento dos Sem Banho.

Logo a moda aderiu variantes mais radicais, como os banhos semanais ou mesmo mensais. Cascão virou garoto propaganda de uma intensa campanha do Governo Federal, que incentivava o não banho como exemplo de uma vida mais sustentável.

Uma das práticas mais insólitas adotadas nesse período foram os banhos pluviais, ocasiões em que a população aproveitava os raros dias de chuva e saía para o quintal ou para as ruas, em trajes de banho, sabonete e xampu em punho, para tomarem banho ao ar livre. Além da gratuidade do líquido e da sustentabilidade do gesto, diziam seus defensores, era um ritual que trazia o homem de volta às suas origens, ligando-o às forças mais elementares da natureza, como água, terra e ar.

O modismo foi por água abaixo quando Raimundo, Presidente do MSB, saiu pelado no meio de um temporal para celebrar a união holística de seu corpo com a chuva, e teve seu bilau impiedosamente eletrocutado por um raio.

E ninguém nunca mais participou dos rituais pluviais.

Ficar sem banho era até divertido, mas sem bilau já parecia um pouco demais para os intrépidos membros do MSB.

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